segunda-feira, 31 de março de 2014

SALVE 31 DE MARÇO!

SALVE A REVOLUÇÃO DA INVOLUÇÃO!

SALVE-SE UMA NAÇÃO SEM SALVAÇÃO?

Por Paulo Cesar de Lara

São 50 anos que distam da tenebrosa data em que o Brasil apostou na liberdade e na segurança, nos valores tradicionais da família brasileira e na desconfiança com um governo supostamente comunista, mas acabou sem liberdade e sem segurança, abdicando de sua liberdade justamente por temer perde-la. Ideologias em choque, manipulações de consciência, luta pelo poder, enfim a escuridão, os chamados “anos de chumbo”.
O tempo passou e o anseio de recuperar a liberdade perdida enfim aflorou na consciência histórica, veio a luta pelas eleições diretas, a Constituinte até que se chegou no momento histórico de se eleger o primeiro Presidente pelo voto direto. Era para ser a apoteose da história politica recente, mas, e sempre tem um “mas”, não foi assim.
De fato, parece mesmo que o brasileiro não desiste nunca de tentar sempre o pior caminho, mas é como dizem a “pecúnia doloris”, o “preço da dor” que se paga pelas escolhas políticas de cada pessoa e de cada sociedade, pois não há decisão solitária que não afete o grupo social e não há decisão coletiva que não afete o indivíduo, pois o homem é individuo e sociedade ao mesmo tempo como afirmado por TEILHARD DE CHARDIN.
Tanta lambança se fez com o termo “Democracia” que seu imaginário acabou se prestando a tudo, num momento Democracia é defender os direitos sexuais das mulheres e daí, a legitimação do aborto, num outro momento Democracia é a defesa da vida a qual abomina o aborto, numa quadra é democrático não discriminar quem tem uma orientação sexual diversa ou uma desorientação às avessas, outro momento ser democrático é defender os valores supremos da família coibindo o discurso de orientação diversa.
Ao final liberdade, autoridade, justiça e honestidade se tornaram como que pássaros desorientados e decadentes, contraditórios e enlouquecidos, pois num mundo onde se pensa que se pode tudo de repente se percebe que não se pode nada. Após uma luta de décadas para se recuperar a liberdade perdida imaginando-se já democrática, a sociedade elege o primeiro Presidente da República, que foi cassado em Processo de impedimento.
Na sequencia transcorreram 2 mandatos do Presidente Fernando Henrique, marcado fortemente com o processo de privatização, foi a liquidação a preço de banana dos bens públicos, Usiminas, Companhia Siderúrgica Nacional, Valeo do Rio Doce e tantas outras Empresas nacionais, na sequencia deu-se a eleição e a reeleição do Presidente Lula, abriu-se caminho para uma desenfreada corrupção, mudou o governo e a Presidenta Dilma não conseguiu recolocar a nação nos trilhos da ética. Aliás, recentemente se descobriu vários pontos em comum em ambos os governos.
Desta forma, como que ciclicamente se dá uma espécie de “eterno retorno” como dizia Friedrich Wilhelm Nietzsche, pois atualmente vem crescendo o clamor dos mais variados setores pelo retorno da ordem política anterior, justamente o período da ditadura militar. Em face de tal fato é conveniente neste cinquentenário analisar o mais polêmico dos Atos Institucionais por suas determinações fortemente agressivas aos princípios que se tem por mais caros na ordem democrática.
São mantidas a Constituição de 24 de janeiro de 1967 e as Constituições Estaduais; O Presidente da República poderá decretar a intervenção nos estados e municípios, sem as limitações previstas na Constituição, suspender os direitos políticos de quaisquer cidadãos pelo prazo de 10 anos e cassar mandatos eletivos federais, estaduais e municipais, e dá outras providências.
Olhando o Brasil de hoje e analisando o Preâmbulo do Ato Institucional nº 1, de 9 de abril de 1964 é impossível não se identificar um único padrão de reivindicação, é como se o discurso de 50 anos atrás utilizado para solapar a Democracia fosse exatamente o que hoje diversos setores da sociedade reivindicam. Vide o texto de 1964:

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL, ouvido o Conselho de Segurança Nacional, e CONSIDERANDO que a Revolução Brasileira de 31 de março de 1964 teve, conforme decorre dos Atos com os quais se institucionalizou fundamentos e propósitos que visavam a dar ao País um regime que, atendendo às exigências de um sistema jurídico e político, assegurasse autêntica ordem democrática, baseada na liberdade, no respeito à dignidade da pessoa humana, no combate à subversão e às ideologias contrárias às tradições de nosso povo, na luta contra a corrupção, buscando, deste modo, "os. meios indispensáveis à obra de reconstrução econômica, financeira, política e moral do Brasil, de maneira a poder enfrentar, de modo direito e imediato, os graves e urgentes problemas de que depende a restauração da ordem interna e do prestígio internacional da nossa pátria" ();
        
CONSIDERANDO que o Governo da República, responsável pela execução daqueles objetivos e pela ordem e segurança internas, não só não pode permitir que pessoas ou grupos antirrevolucionários contra ela trabalhem, tramem ou ajam, sob pena de estar faltando a compromissos que assumiu com o povo brasileiro, bem como porque o Poder Revolucionário, ao editar o Ato Institucional nº 2, afirmou, categoricamente, que "não se disse que a Revolução foi, mas que é e continuará" e, portanto, o processo revolucionário em desenvolvimento não pode ser detido;
        Os “considerandos” do Ato Institucional nº 5 fazem referência a preservação da “ordem, a segurança, a tranqüilidade, o desenvolvimento econômico e cultural e a harmonia política e social do País comprometidos por processos subversivos e de guerra revolucionária;”
           Determina o Art. 2º que “o Presidente da República poderá decretar o recesso do Congresso Nacional, das Assembléias Legislativas e das Câmaras de Vereadores, por Ato Complementar, em estado de sitio ou fora dele, só voltando os mesmos a funcionar quando convocados pelo Presidente da República”.
Hoje, passados 50 anos, não são poucos os que aplaudiriam fechamento das Casas Legislativas, até mesmo com a prisão de grande parte dos Parlamentares, dada a corrupção desenfreada, generalizada e crescente da classe política brasileira, em sua grande parte envolvida nos mais bizarros atos de expropriação pública, corrupção e tráfico de influências.
Quanto ao ganho absurdo dos Parlamentares com todas as suas vantagens determina o § 2º que “Durante o período de recesso, os Senadores, os Deputados federais, estaduais e os Vereadores só perceberão a parte fixa  de seus subsídios.”
        Diversos Estados e Municípios afundados em desmandos e corrupção tem em sua população não poucas correntes ideológicas que reivindicam intervenção e deposição dos mandatários e alcaides locais e encontram no AI 5 em seu Art. 3º o alento a este anseio, pois que o dispositivo determina que “O Presidente da República, no interesse nacional, poderá decretar a intervenção nos Estados e Municípios, sem as limitações previstas na Constituição”.
        Contudo, o Parágrafo único determina que “Os interventores nos Estados e Municípios serão nomeados pelo Presidente da República e exercerão todas as funções e atribuições que caibam, respectivamente, aos Governadores ou Prefeitos, e gozarão das prerrogativas, vencimentos e vantagens fixados em lei”.
Por certo há a renúncia do cidadão a escolha de seus dirigentes, mas é crescente o anseio para que as pessoas não sejam obrigadas a votar, entendem que na verdade não tem uma verdadeira opção e todo discurso de autoridade neste contexto exerce profunda impressão nas pessoas que não teriam muita dificuldade em aceitar um poder político mais abrangente que destrone as dinastias locais cujos abusos e desmandos são sempre mais próximo das pessoas.
       O Art. 4º é um dos mais violentes atos de poder ditatorial, pois prevê que no interesse de preservar a Revolução, o Presidente da República, ouvido o Conselho de Segurança Nacional, e sem as limitações previstas na Constituição, poderá suspender os direitos políticos de quaisquer cidadãos pelo prazo do Preâmbulo do Ato Institucional nº 1, de 9 de abril de 1964.
O que o texto ditatorial do Ato Institucional nº 5 denomina de “limitações”, é na verdade o elenco de direitos fundamentais, de garantias constitucionais que asseguram o amplo direito de defesa e toda a gama de direitos processuais, os direitos de menores infratores, os direitos dos presidiários, de assaltantes, de traficantes, de políticos corruptos, de pessoas que tem poder aquisitivo e influência política, são as mesmas e diversas garantias contra as quais todos os dias os programas televisivos se voltam em violenta crítica contra a impunidade.
Por outro lado os mesmos direitos que garantem os direitos dos mais decaídos na escala social também são os direitos de todo homem, mulher e criança não alinhados ao crime nem a impunidade, mas que podem ser afetados por atos de poder sem garantias, um poder incontido e por isso absoluto. O Art. 5º determina que A suspensão dos direitos políticos, com base neste Ato, importa, simultaneamente, em:
       O art. 5º § 1ºdetermina que “O ato que decretar a suspensão dos direitos políticos poderá fixar restrições ou proibições relativamente ao exercício de quaisquer outros direitos públicos ou privados, ao passo que o Art. 6º determinam que ficam suspensas as garantias constitucionais ou legais de: vitaliciedade, inamovibilidade e estabilidade, bem como a de exercício em funções por prazo certo.
Ora, o que um Juiz ou um Promotor de Justiça poderá fazer sem as garantias nas funções que exerce? Não restam garantias de qualquer natureza. O artigo 5º determina em seu § 1º - que o Presidente da República poderá mediante decreto, demitir, remover, aposentar ou pôr em disponibilidade quaisquer titulares das garantias empregado de autarquias, empresas públicas ou sociedades de economia mista, e demitir, transferir para a reserva ou reformar militares ou membros das polícias militares, assegurados, quando for o caso, os vencimentos e vantagens proporcionais ao tempo de serviço.
Observem-se os poderes incontidos do regime militar bem como o que determina o Art. 7º que abriu o caminho para o regime decretasse estado de sítio e prorrogá-lo, fixando o respectivo prazo, o direito de propriedade é agredido no Art. 8º que permite após “investigação” a decretação do confisco de bens de todos quantos tenham enriquecido, ilicitamente, no exercício de cargo ou função pública, inclusive de autarquias, empresas públicas e sociedades de economia mista, sem prejuízo das sanções penais cabíveis.
Atualmente são muitos os que pregam o confisco de bens de suspeitos de haverem enriquecido com o dinheiro público. Observe-se que o texto não menciona o Processo Judicial como preliminar ao confisco de bens e sim a uma mera “investigação”. (Em nada resolve a previsão que determina a restituição (Parágrafo único) provada a legitimidade da aquisição dos bens, far-se-á sua restituição).
A sociedade vem clamando no sentido de que os bandidos devem ficar presos e não devem ter direitos, muito menos habeas corpus. Pois bem, o Art. 10 determinou que ficasse “suspensa a garantia de habeas corpus, nos casos de crimes políticos, contra a segurança nacional, a ordem econômica e social e a economia popular.” Em complemento a extinção do Habeas Corpus o  Art. 11  determinam que “excluem-se de qualquer apreciação judicial todos os atos praticados de acordo com este Ato institucional e seus Atos Complementares”.
Ora, a extinção do Habeas Corpus, o sufocamento da jurisdição soberana do Judiciário, a suspensão de direitos, a cassação de mandatos tudo inviabilizou a Democracia, abriu as portas para desmandos e torturas, prisões ilegais, impunidades. Sobretudo, a incerteza e o medo. Apesar de tudo isso, ainda hoje, não é poucos os que clamam pelos Militares, pela Ditadura, pela derrocada do sistema constitucional de garantia s como condição de uma suposta segurança, de uma improvável estabilidade.
Instabilidade econômica, corrupção em franca expansão e acima de tudo, a impunidade acrescido do rumor das ruas abre caminho para uma condição ideal de retrocesso político institucional. Tudo parece mesmo demonstrar que estamos diante de momentos cíclicos, diante do “eterno retorno”.