KARL MARX.
TEÓLOGO, JURISTA OU SIMPLESMENTE "KARL MARX" ?
Paulo Cesar de Lara
Mestre em Direito Constitucional (UFMG)
Especialista em Políticas Públicas (UEPG)
Professor Universitário (UEPG e CESCAGE) e Pesquisador do
CNPQ
Professor de Direito Internacional Público e Direitos
Humanos.
Advogado que atuou na Comissão Interamericana de
Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos
Advogado atuante em Advocacia Internacional.
“Demorei a
vida toda para ser o que sou. Valeu à pena?”
(Richard Bach)
Resumo: O tema da presente reflexão faz alusão a KARL MARX, na verdade tão somente
algumas observações singelas em nosso sentir, sobre alguns temas sobre os quais
se pensou e pensa sobre este gigante do pensamento, considerando a imensidão
que se tem ainda a escrever sobre MARX.
Neste sentido tem sentido indagar, se seria MARX
um teólogo um jurista, ou apenas “KARL MARX”?
Sim, pois, marxistas há que são mais marxistas que o próprio MARX. Enfim, seria MARX apenas um homem angustiado
buscando as respostas para os homens do seu tempo, como tantos outros o
fizeram? Ou se imaginava ser um gênio Pai de um oráculo que tudo explica e tudo
se aplica sendo o pórtico para o passado, futuro e presente? Com estas indagações
iniciam-se estas reflexões que versam sobre os reflexos da perspectiva marxista
na produção e interpretação do Direito fornecendo ao amigo leitor algumas questões
interessantes como objeto de reflexão sobre a importância da compreensão das
correntes de pensamento que influem na vivência e interpretação do fenômeno jurídico.
Palavras chave: Marxismo.Escolas. Pensamento.Hermenêutica.
Já se discorreu sobre a importância da
compreensão das correntes de pensamento que influem na vivência e interpretação
do fenômeno jurídico, mas não somente porque tais questões são exigidas cada
vez mais em Concursos públicos de toda ordem, mas pela importância vital que
tem para a compreensão ampla do fenômeno jurídico entrelaçado com vertentes
econômicas, filosóficas, psicológicas, sociológicas, psicanalíticas, históricas
cuja incompreensão nos leva a tatear no escuro de uma existência que não se
reconhece nem se compreende num mundo repleto de mudanças num crescente fluxo e
contra fluxo de poder e ganância que domina cada vez mais as existências.
Quase sempre tal espírito empobrecido
e colérico vem acompanhado pelo discurso do jurista no sentido de justificar ou
negar a realidade das coisas transformando a lei em fibra vital do existir e as
decisões dos Tribunais oráculos invioláveis de falas etéreas, inquestionáveis e
não raras vezes incompreensíveis que nem o mais talentoso “embargo de declaração”
pode dar cabo.
Assim se fala de MARX, este grande pensador da humanidade e da construção de sua crítica
violenta e absoluta ao capitalismo inglês delimitado a certas condições e a
certo período histórico. Quem deseja mais do que isso de um pensador não busca
o pensador e seu pensar humano, mas, sim anseia no fundo por um Super Homem, ao
qual se referia NIETZSCHE, como que um “Salvador da Pátria” numa Pátria sem Salvadores
e Salvadores sem Pátria.
No XV Concurso Público para provimento de cargo de
Juiz Federal Substituto da 4ª Região (PR, SC, RS) na última questão discursiva,
foi solicitado aos candidatos que dissertassem sobre a interpretação do direito identificando algumas teorias e escolas de pensamento. Questões de hermenêutica nunca são temas que
se possa desprezar por ser algo tão essencial na vida do operador do Direito.
Ousamos trazer a lume algumas reflexões nossas
escritas desde há muito tempo, sobre um das possíveis linhas de pensamento que
trabalha o Direito do ponto de vista material histórico. Referimo-nos a
interpretação marxista do Direito.
São reflexões minhas, evidentemente, mas, que coloco em comum por ser oportuno
considerando as diversas indagações dos candidatos ao cargo de Juiz Federal, um
dos Concursos mais difíceis na carreira jurídica, razão pela qual se deve ter a
maior admiração intelectual ante os candidatos a caminho da árdua aprovação e
também como incentivo aos jovens estudantes, para que compreendam que o caminho
é gratificante, mas também árduo.
Inicialmente, é interessante salientar que KARL MARX,
colabora com a reflexão sobre a explicação do fenômeno jurídico com seus
escritos desde a primeira metade do século XIX, razão pela qual vou destacar
alguns aspectos que entendo fundamentais em sua análise.
Como não é possível detectar todo o funcionamento do
Estado nos seus pontos principais, Marx vai localizar o seu estudo numa certa
área específica, ou seja: a explicação dos fenômenos políticos como o Estado e
o Direito, a partir das condições materiais históricas, para daí alargar sua
análise. Ressalte-se, esta é uma leitura particular minha sobre a obra de MARX.
Desta forma convido ao debate os meus estimados leitores, seria muito
enriquecedor.
O homem na produção da sua condição existencial, o
homem na sua missão de perpetrar a sua existência, de garantir a sua existência
material, e até mesmo espiritual e intelectual, nesse processo de produção da
sua existência, já se encontra numa teia de relações já previamente
estabelecidas, relações estas que constituem um substrato econômico, uma base,
uma plataforma pré-determinada.
De tal forma que o simples nascimento de uma criança
já é um fator de poder. Vide que HERODES
determina a matança dos inocentes para que se evitasse o nascimento de um Rei
que poderia frustrar os seus planos de poder. Assim padeceram dezenas de
inocentes, como relatado pelos evangelistas.
Sobre este substrato econômico, a superestrutura, vão
se assentar as estruturas outras, as derivações estruturais, sobre este
substrato econômico, sobre esta base que Marx vai chamar de núcleo-duro, vai
ser estabelecer uma estrutura jurídica e uma estrutura política que
naturalmente está comprometida ideologicamente com esta estrutura econômica
primitiva, pré-determinada, na qual se assentam as outras estruturas ou
sistemas sociais, os sistemas políticos e jurídicos.
É sobre este conjunto de relações econômicas de
produção que é estabelecido pela superestrutura econômica e com derivações
estruturais na área do sistema político e jurídico, é que se assenta a
significação simbólica do político e do jurídico no plano da ideologia e por
outro lado se consubstancia o estruturalismo capitalista.
Para MARX é
esta estrutura de relações econômicas que sustenta a validade significativa
político ideológica é que vai determinar a consciência do homem. A consciência do homem é determinada
a partir de determinantes eminentemente materiais, a partir do fator econômico
se estabelece o estado de consciência das pessoas.
Não é a consciência que determina a realidade. É a
realidade social que determina a consciência. O homem não vive como pensa, o
homem vive como pode, ou seja, por um lado eu posso imaginar que é a redução da
grandeza do homem a mera condição material. Daí a reação à época no sentido de
se interpretar o pensar de MARX como uma degradação da dignidade humana, com
certeza.
Evidentemente quando procura explicar a complexidade
do fenômeno do ser humano, apenas a partir do referencial econômico, se esta a
reduzir o homem à dimensão da materialidade. Ora, evidentemente, em face à
concepção marxista é necessário atentar que MARX
não diz que deveria ser assim, mas que o capitalista reduz o homem a isto. Pois
bem, é justamente neste ponto de interpretação e crítica da obra de MARX que a
minha forma de ver difere de muitos críticos antigos e modernos do marxismo. É
importante ressaltar isso.
Diante de uma concepção Tomista-Aristotélica, poderia
ser interpretado como heresia este entendimento que estaria a reduzir o homem
ao material, pois, se estaria negar a dimensão religiosa do homem, ao afirmar
que o homem se explica tão e somente a partir das condições materiais da
produção da sua própria existência, se estaria a negar a natureza
transcendental do homem e por isso mesmo nega-se o homem enquanto filho de
Deus.
Nega-se a humanidade e a dvindade em face aos valores
do Cristianismo. É por isso que o marxismo não pode ser aceito pela religião
oficial que adotou como sistema filosófico, o sistema Tomista – Aristotélico, a
religião católica apostólica romana.
Essa que é a razão. É por isso que quando a teologia
da libertação, hoje já esquecida, mas fator de grande celeuma na Igreja romana
nos anos 80, tendo como grande corifeu no Brasil, frei LEONARDO BOFF, homem de profundo espírito humanista e um dos
maiores intelectuais da América Latina, acompanhando GUTIERREZ, considerado um dos “pais” da Teologia Libertária, começam
utilizar categorias marxistas para explicar a situação do ser humano em face à
opressão e a necessidade da religião ser o instrumento libertário desse mesmo
homem, existe a condenação oficial da Igreja, devido ao fato de que a chave
interpretativa desse sistema opressor é materialista atéia.
É que se subestimava a teoria de JAQUES MARITAIN, grande inspirador da Doutrina Social da Igreja
divulgada através das Encíclicas papais (principalmente A Carta “Coisas Novas”
e “Centésimo Ano”) e do seu humanismo integral, a contemplar o homem em suas plúrimas
dimensões existenciais.
Essa é uma explicação e uma crítica que se faz ao
pensamento de MARX. Porém, alguns
autores vão dizer que isso é uma coisa equivocada porque MARX não se predispôs a fazer um estudo religioso profundamente
antropológico do homem.
Não se dispôs a fazer um estudo sobre a moralidade e a
espiritualidade. Não se dispôs a introduzir nos seus estudos a teodisséia, a
história de Deus na história humana, a geração divina e muito menos se
preocupou em criar um sistema perfeito de sociedade, mesmo porque isto seria
impossível a um homem só.
MARX delimitou um ponto de estudo, qual seja: A CRÍTICA AO ESTADO LIBERAL. CRÍTICA AO
SISTEMA CAPITALISTA, CRÍTICA AO FATO DE QUE ESSE SISTEMA CAPITALISTA REDUZ O
HOMEM A UMA MERA COISA. (reificação, coisificação) e o homem por isso mesmo
tem a sua vida negada, escravizada, a sua dimensão humana reduzida por causa do
próprio sistema capitalista que vê no homem um instrumento do lucro, da
exploração e por isso mesmo o submete à injustiça e à sua desumanização.
Então MARX se preocupa em delimitar esse
aspecto, esse campo específico: A EXPLORAÇÃO DO HOMEM. E ele só pode explicar
essa exploração a partir de categoriais econômicos e materialistas, porque o
homem está inserido num sistema de dominação materialista. Essa é a tentativa
de Marx que não se preocupa com a questão religiosa, com a questão de Deus.
Essa preocupação ele deixa para os teólogos.
MARX só se preocupa com o fator religião à medida que ele
identifica na religião a possibilidade de que algumas práticas religiosas e a
manipulação do sagrado, dos valores do religioso, dos valores do sagrado, de
que os símbolos sagrados sejam utilizados como instrumento de dominação
ideológica.
Aí sim, se compreende a frase: “religião como ópio do
povo”. Sim como qualquer outra ideologia, inclusive a marxista. MARX se preocupa porque vai implicar
justamente nessa dimensão libertária do homem. Neste sentido MARX era totalmente antimarxista,
conquanto, estranho isso possa parecer.
Quando MARX diz
que a religião é o ópio do povo, MARX não nega a religiosidade do homem, mesmo
porque, a religiosidade do ser humano é um fator implícito, intrínseco e o
homem não vive sem essa ânsia de infinito, sem essa crença em alguma coisa que
supere a sua própria realidade. O homem não vive sem essa dimensão
transcendental.
Talvez a obra de MARX,
de mais de 30 anos de trabalho fosse talvez este anseio religioso de se lutar
contra a injustiça, talvez fosse sua forma religiosa de ser e de estar no
mundo, pois MARX aspirava algo mais
para a situação do homem ante a sua desumanização, tal qual o homem religioso e
todo home é religioso, apesar de não ter uma Religião dogmaticamente
identificada, pois bem, o homem e todo homem aspira pelo infinito.
O ser humano, sendo finito, tem a consciência disso e
aspira, anseia, deseja o infinito. Ele busca um complemento, uma resposta, algo
mais para a sua vida. E isso explica todas as ânsias filosóficas e religiosas
do ser humano. MARCO TÚLIO CÍCERO,
grande personalidade do final da República Romana quando do início da
decadência do Imperito Romano, dizia que, em todas as culturas, há um aspecto
comum a todas elas, é a expressão da religiosidade, sinais sagrados, templos,
evidências da ligação do homem com algo maior do que ele, seu mundo, suas crenças.
É a expressão da religiosidade. Todo homem é religioso, mas nem todo homem tem
uma religião institucionalizada.
MARX se preocupa com a religião nesse aspecto. Se Deus
existe, não é esse o seu objeto de estudo, mas sim, mostrar a exploração do
homem, o esmagamento e a destruição do ser humano e demonstra que esse mesmo
sistema de dominação, destrói as condições necessárias para que o homem possa
produzir sua própria felicidade. À medida que o homem, na sua tentativa de
reproduzir as suas condições de existência, já entra num jogo com as regras pré-definidas,
essas condições de existência também já vão estar pré-definidas.
É o primeiro passo para romper esse fluxo do poder, é
um contra fluxo do poder, compreender como funcionam essas estruturas de poder
e de morte para, a partir dessa consciência, se contrapor e destruir esses
mecanismos. É muito fácil dizer que o homem é digno, que o homem tem uma
dignidade incrível, e não se pode reduzir sua explicação, sua complexidade
existencial à mera análise materialista das condições materiais históricas de
sobrevivência e de perpetuação da existência humana.
É muito lúdica tal concepção, idealista. Mas isso não
nos dá uma consciência que possibilite a transformação da realidade. MARX vai dizer que, durante muito tempo,
os filósofos têm interpretado a realidade, mas era chegada a hora de
transformar essa realidade.
MARX não explica as nossas condições de existência a partir
da mística religiosa, da abstração do humano. Sua perspectiva de estudo é
outra. HEGEL influenciou o pensamento
de MARX. MARX, ingenuamente, acreditava que o Estado era o grande guardião
dos interesses gerais e o grande guardião dos interesses do Direito.
Depois,
analisando o pensamento de HEGEL que
diz que é uma imaturidade, uma imprudência o filósofo imaginar que o Estado é
uma coisa abstrata e não imaginar que o Estado nada mais é do que o reflexo do
caráter dos homens, do que o reflexo dos valores humanos, do que o resultante
direto das nossas ambições, dos nossos vícios, das nossas virtudes. Então MARX vai amadurecer com essa idéia e vai
concluir de fato que o Estado não é o grande guardião dos interesses gerais da
sociedade e nem do direito.
O Estado é o grande guardião dos interesses da
burguesia, dos interesses de uma classe social, a classe econômica. Mas o
Estado na sua evolução passa não só tutelar os interesses burgueses, mas, acaba
por ser a arena aonde vão se digladiar o orgulho, as ambições humanas, as
paixões e as vaidades humanas. É tudo aí no mundo da política porque é o mundo da
polis e é o que é mais importante para o homem: “o bem viver”. Mas como?
Naturalmente, depois, atualizando o pensamento de MARX, compreende-se que esse Estado que
antes era esse instrumento de dominação, agora se torna a arena do conflito
entre dominados e dominantes que possibilita a chance histórica de que as
relações não só estejam já previamente determinadas, mas, venham a ser
construídas e que as relações humanas venham novamente ser reengendradas,
reconstruídas, reinventadas, reimaginadas, ou seja, que existe uma condição
histórica de esperança, que existe uma chance histórica de modificação, de
mudança, de refazer os caminhos históricos, rumo à liberdade.
A idéia da utopia (“lugar que não existe“, como
mencionado no romance de THOMAS MORUS), finda por esmorecer. Esse
recrudescimento do Neoliberalismo, as relações econômicas mais injustas, a nova
ordem mundial que, quem tem condições é contemplado, quem não tem está excluído
definitivamente de viver.
Tudo isso é conseqüência da grande perda da utopia,
porque quando se imaginava no leste europeu, em outros países que era possível
uma alternativa fora do sistema capitalista, ainda se lutava para conseguir
mudar.
Porém, com a queda do leste europeu, com o
esfacelamento da União Soviética, com o fracasso dos países socialistas, morre
a utopia para muitos, ignorando “um olhar que persiste“.
Qual foi a consequência no plano da consciência do
homem do nosso tempo, no plano da politica das nações, oque se deu quando se
começou a propalar a crença de que não haveria esperanças mesmo de mudanças. E
o que aconteceu na Europa foi o desemprego massivo, e tantos outros efeitos da
morte da utopia socialista, para alguns.
Pior ainda foi o drama dos países em que a esquerda
chegou ao poder cujo exercício foi tão absurdamente contraditório as doutrinas
políticas e a mística que sustentar a luta histórica de uma classe social que
até agora não se concluiu ainda com seriedade e de forma desapaixonada um
inquérito sobre a tragédia das esquerdas no poder, como foi e está sendo o caso
do Brasil, do ponto de vista da utopia sonhada e da pratica politica realizada.
O grande modelo econômico que essa nova economia impôs
o estraçalhar dos miseráveis, dos pobres, o empobrecimento, o desemprego, a
exclusão social, o agravamento da injustiça, a concepção de projetos
econômicos, políticos e sociais que não levam em consideração os pobres, os
fracos, os esquecidos e só contemplam uma parcela, um pedaço do mundo, do povo,
a “valentio pars” da humanidade.
A parte preponderante das nações ricas em seu naco do
poderio econômico (8 em especial) dos países ricos impõem o seu projeto
econômico aos países pobres, o fundo monetário internacional que impõe uma
dieta letal para os países empobrecidos da América Latina e os países de terceiro
mundo. Mas alguns países reagem à morte dessa utopia, pois a globalização é
estanque a certos aspectos, não se globalizou a preocupação com o extermínio da
miséria e da forme.
Dentro desta contradição toda, não se pode negar que o
governo LULA alcançou o que não se imaginava ser possível, antecipou a meta da
ONU e antes de 2014 conseguiu diminuir consideravelmente a quantidade de pobres
em miséria absoluta com a malha de proteção social empreendida.
Ao longo dos anos 90/2010, houve uma sucessão de poder
no plano mundial bem interessante, inicialmente o parlamento do Canadá, da
França, da Itália e da Inglaterra se tornou em grande parte esquerdista. Em
todos esses países, a esquerda começou a se fortalecer novamente para dizer um
não a esse projeto neoliberal, e o Brasil caminhou para no sentido oposto com
os dois governos sucessivos de FERNANDO HENRIQUE.
Então essa queda da utopia, a queda da esperança de
que é possível mudar, que é possível que as coisas não fiquem assim para
sempre, essa nova ordem mundial impõe a morte dos sonhos, da utopia, da
mística, começou a ser quebrada, a esquerda subiu ao poder, decepcionou em
grande parte, houve a ascensão da direita e agora caminha o mundo meio que
dividido, um esquizofrênico politica e economicamente falando.
KANT dizia que a mística é o salto mortal da razão
para o infinito, é um profundo sentido da espiritualidade das coisas. Parece
que Marx é profundamente impregnado dessa mística na medida em que denuncia a
injustiça e a miséria, sistematiza uma crítica que desmascara a retórica
burguesa.
Fosse os ardorosos “marxistas”, um pouquinho à imagem
e semelhança de MARX, talvez a
história tivesse tomado outro rumo. Ao invés da imagem, preferiram ficar “a
margem”. MARX é alguém que sentiu na
sua carne, na sua vida a injustiça social à miséria. MARX morreu pobre. Seus filhos morreram na pobreza. Alguns morreram
de miséria. MARX começou estudar
direito, mas desistiu porque entendia que advocacia é uma profissão para
parasitas. Achava que deveria fazer uma coisa mais útil. (ao menos é o que
dizem alguns biógrafos de MARX).
MARX se volta ao estudo da Economia. Depois ele vai ver
que vai precisar do Direito, percebe que estava errado, pois o papel do Direito
é fundamental nesta engrenagem do poder e do mando do mundo e das pessoas. Vai
precisar entender Economia porque o sistema capitalista não é uma coisa que
surgiu ao acaso. Foi sendo construído aos poucos com base na ambição humana,
com base no lucro, na falta de solidariedade, na falta de fraternidade, na
falta de irmandade, na falta de piedade. Porque o lucro é o lucro.
O excedente de produção dos agricultores que era
ofertado aos deuses, diminuía esse excedente, na verdade o eliminava, e por
isso mesmo diminuía as possibilidades de uma classe que se apropriasse desse
excedente e passasse a dominar outra, evitava isso no começo.
Mas depois, esse excedente de produção, o capitalismo,
segundo (que usa uma linguagem mística) torna-se o “deus” da sociedade. É o “deus”
capital, é o “deus” dinheiro e esse “deus” exige suas oferendas. Só que a sua
oferenda é uma oferenda de sangue. É um holocausto de sangue, exige vidas e
essas vidas são as vidas dos pobres, dos fracos, dos indefesos da sociedade,
porque é à base dos fracos, dos indefesos, dos pobres é que continua sobrevivendo
o capitalismo e as oferendas continuam sendo feitas ao “deus” capital.
Dentro do nosso arquétipo, dentro da nossa estrutura
mental, dentro da nossa estrutura mística de religiosidade continua sendo uma
relação de oferenda. Eu posso garantir a minha situação de vida contanto que eu
esteja disposto a sacrificar o meu irmão?
Eu tive a oportunidade de estar presente numa passeata
em 1998 nos Estados Unidos, em frente à Casa Branca quando se iniciava o
conflito no Iraque e recordo de um cartaz escrito em inglês, cuja tradução era
mais ou menos assim: “Não queremos o
petróleo do Iraque à custa do sangue das crianças iraquianas”.
Isso foi curioso porque apesar de tudo ainda estava no
imaginário do povo norte americano que tinham o “direito ao petróleo do
Iraque”, não sei, porque cargas d água, mas, achavam que tinham o direito. Mas
vamos deixar para pensar nisso quando ao invés da guerra do petróleo estivemos
em meio a Guerra das águas e o cenário, evidentemente, a Amazônia, aí sim vamos
nos ocupar disso, da tradução correta.
Mas, o que estava em questão era se for preciso jogar
a bomba atômica sobre um país, para garantir os interesses econômicos norte
americanos, isso vai ser feito? E sem crise de consciência alguma? A história
tem demonstrado que sim.
A social democracia vai tentar mesclar um pouco o
socialismo com o capitalismo. No mundo todo, os regimes sociais democráticos
faliram e a resposta a isso foi o crescimento da esquerda a partir dos anos 90.
Na Espanha, na Itália, na França, em toda a parte, se verificou este fenômeno,
agora já em onda de contra fluxo.
A social democracia acabou, encaminhando-se para um
socialismo melhor definido, acontece que a social democracia foi engolida pelo
social liberalismo, pela mundialização da economia e daí nos veio a grande
confusão onde não mais se sabe quem é quem o que é o que na ordem do dia.
A proposta do Presidente brasileiro (FERNANDO HENRIQUE) não fôra a social
democracia? O que aconteceu com a social democracia? Presenciamos sim uma
regime autocrático com sobre carga do poder executivo sobre os demais num
período de 8 anos de governo via Medida Provisória. O que aconteceu com a
proposta que havia no Brasil de educação, de escola, de ensino, de segurança,
de justiça?
Em termos bem rudes, por certo bem poderia se
responder com dados notórios que as promessas foram engolidas por um processo
onde o país se vê novamente num sistema altamente excludente que gerou mais
miséria, mais pobreza, mais desemprego porque era um modelo que é dado para os
países ricos e é imposto aos países pobres para que eles repitam esse modelo
econômico, porque se eles não repetirem vão trazer prejuízos para os países
ricos.
E se os países pobres se quiserem ter algum benefício
ou não ser patrulhados, como Cuba, e como outros, aceitam esse modelo
capitalista neoliberal que condenou os povos à morte. A dívida externa da
América Latina está comprometendo todo o desenvolvimento dos países latino
americanos, mas é o modelo que é imposto. Também não se diga que o Brasil
“pagou a dívida externa”, pois, o fez à custa, do endividamento interno, o que
não se pode dizer que seja uma solução ideal e menos problemática, nem menos
traumática.
Hoje o que se discute é como passar do Estado Liberal
em que estamos para o Estado Social, sim, pois, no Brasil não chegamos ao
Estado Social pleno, vivemos de espectros históricos, de projeções de sonhos
sonhados por outros. Como, ao menos, minorar as consequências desse
capitalismo, de que forma fazer isso?
Ocorre que isso não é apenas um projeto político
isento, objetivo, desinteressado, pelo contrário, implica em questões éticas,
em aspectos morais. Mas que isso, em aspectos psicológicos, onde se vai
esbarrar na a ambição humana que não tem limites, não tem barreiras. Afinal já
se disse que na vida tudo tem limites, exceto e imbecilidade humana.
O único limite para a ambição humana é a garantia de
que seus interesses vão ser mais protegidos ainda. É por isso que o capitalismo
garante a sua reprodução. Seja em face do que for. Na ótica da “ética capitalista”
o que importa é a sobrevivência, mesmo que o preço seja a traição, a insídia a
calúnia, a mentira, e o sacrifício dos próprios companheiros para manter-se no
poder.
Pois, bem, o papel do Direito é um pouco tudo isso que
se mencionou aqui, é um instrumento para proteger os donos do poder para MARX é isso, um instrumento produzido
pela classe dominante, mas, o direito no Brasil também produziu políticas
afirmativas e tantos outros instrumentos de benefício das classes pobres, e
isso demonstra a necessidade de se ponderar melhor ao se imaginar que 100% do
que escrito por MARX se aplica de pronto a realidade não só brasileira, mas
mundial como um todo, pois, o direito é algo muito mais complexo do que o que o
gênio de MARX imaginou.
Mas afinal, exceto o capitalismo inglês do século XIX,
qual outro modelo teria MARX para
analisar que oferecesse tão extremada plêiade de fenômenos econômicos, políticos
e jurídicos? Portanto o que MARX se propôs
a fazer, MARX cumpriu ao analisar um
sistema datado, historicamente mutável e senhor de uma lógica, a lógica da acumulação,
enriquecimento e produção de mais e mais riquezas ás custas de maior e mais
severa exploração do trabalho humano.
Assim também, HANS
KELSEN se propõe a transformar o amálgama indiferenciado de valores e
sistemas enfeixando os valores dos mais variados (crendices, encantamentos com
filosofia e poesia) em algo racional, referencial para se compreender o Direito
como um sistema de normas hierarquizadas onde a inferior se fundamenta na
superior e assim sucessivamente.
No entanto numa perspectiva anti-histórica e filosófica
e anti “tudo”, se deseja de MARX, KELSEN,
apenas para falar de dois, não só um método explicativo que valeu ontem, home e
sempre, mas como demonstrado por RICHARD
RORTY, todo saber é datado, é um instante recortado na existência, um “flash”
do ser histórico a revelar seus desenlaces de forma precária, humilde e
reverente ante o mistério da vida que é mais que a própria vida e mais do que a
morte.
Por isso mesmo o Direito tornou-se algo muito mais
perigoso e problemático e demanda outras explicações e enfoques, como a
sofisticada teoria sistêmica de NIKLAS
LUHMANN, a qual compreende o Direito num aspecto muito mais profundo e
amplo, do que o compreendido pela crítica marxista, como será demonstrado em
outros escritos em outra oportunidade. Afinal a sociedade tornou-se uma
realidade muito mais complexa, mutante, mas isso também foi intuído por MARX.
Inclusive há perspectivas psicanalíticas sob as quais
se discorre sobre as Instituições Jurídicas, as Leis, e até mesmo a estrutura
psíquica do ser humano como forma de se perceber o próprio espírito da
Constituição analisando-se as manifestações do "self" do Sujeito
constitucional, como o faz MICHEL
ROSENFELD. Isso demonstra mais um aspecto da riquíssima e variada gama de
enfoques de ordem sociológica, psicológica, econômica, filosófica, teológica e
tantos outros olhares distintos sobre um mesmo tema.
Por derradeiro, finalizando as reflexões sobre MARX, porque com elas se iniciou o
discurso, as utopias marxistas também decepcionaram quando encarnadas na
prática das sociedades e do exercício do poder dito popular e libertário, usando
o termo “Democracia”, da forma, mas
lastimável que se possa imaginar, tal qual um descrente infiel que acende uma
vela para cada Santo, pois cada promessa é uma promessa a mais a ser quebrada.
Assim, a Democracia se torna como que uma história de
promessas não cumpridas, como no triste caso brasileiro, porque às vezes, as
utopias se tornam realidades e se mantêm em grandeza e dignidade, à vezes não,
ou ainda, algumas vezes até se mantêm de certa forma, mas, nunca da forma profunda,
ampla e satisfatória que em tese poderia vir a ser, eis que nem sempre a
tortuosa estrada permite ao viandante trotar com a cabeça erguida e com os
olhos nos olhos.
Para nós, que presenciamos a forma como parte
significativa da força política das “esquerdas” (porque são muitas as
esquerdas) se encarnou e lamentavelmente se encarniçou na história política brasileira
mais recente, e exerceu o poder, talvez, nos seja refrigério a compreensão do
que estamos a viver, vindo à mente a mensagem de RICHARD BACH, em seu livro belíssimo, traduzido para a versão
portuguesa intitulada “FERNÃO CAPELO
GAIVOTA” que escreveu: “Demorei
a vida toda para ser o que sou. Valeu à pena?”
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